ANO
DE 1931
Sonhos, Risos e Lágrimas ( a Francisco
Otaviano – 1825-1889)
Quantas vezes chorei de felicidades!
Quantos risos ocultaram-me o
pranto!
Quantos sonhos acreditei
realidades!
Quantas mágoas eu sofri no
próprio encanto!
Quão feliz me senti chorando
de saudades!
Quão triste fui ao rir sem
mostrar espanto!
Quão sublimes foram meus
sonhos sem verdades!
Quão descrente nos fez um
ideal tão santo!
Os risos seriam cruéis; então
chorei...
As lágrimas me envergonhariam;
então ri...
As verdades seriam duras;
então sonhei...
Hoje, sinto saudades das dores
que sofri...
E quando me lembro dos
instantes que gozei,
Vejo: não só passei pela vida,
mas vivi! ( 26-6-31)
Olhos
Os olhos não falam, mas dizem
tudo,
Tudo num dizer puro e
indefinível,
Que só o coração por também ser
mudo,
Mudo dizer dos olhos é
compreensível.
Nos olhos se espelha o íntimo
rudo,
Rudo tal qual vil alma desprezível,
Assim como neles ver-se a
miúdo,
Miúdo encanto sempre
aprazível.
Tudo, menos os olhos, pode
mentir,
E mudar um paraíso em
abrolhos,
Ou grandes mágoas em risos
expandir.
Se nosso coração sangra em
escolhos,
Só na vista isso pode
refletir,
Porque noss’alma se espelha
nos olhos. ( 17-7-31)
Vida
Mortal, feliz ou magoado, dize
ao mundo,
A esse punhado de tolos,
amigos teus,
Que pintam céus, infernos e o
próprio Deus,
Dize de coração aberto e
profundo:
A vida é um sonho de
eternidade:
Quando o eterno dorme, o sonho
se realiza,
Desponta num’alma que se
concretiza
Num corpo crescente a luz da falsidade!
Sonhando, o corpo vivo
lentamente cresce:
Aprende o que não sabe, o que
supõe ensina...
Realismo!... A fantasia se
extermina
Na desilusão que aos poucos
aparece.
O eterno dorme, e o sonho
escorre...
Quando a alma se desliga da
matéria
Para gozar o bem ou curtir a
miséria,
O eterno acorda e a vida
morre. ( 13-8-1931)
Aos 18 anos
A mais bela flor que recende;
A mais linda estrela que
cintila;
O mais gentil facho que se
acende;
A mais sublime idade que
brilha. ( 10-10-1931)
Coração
Nada quero ser, porque sei que nada sou...
Meu coração é uma triste
sepultura,
Que conhece a vida por noite
de tortura,
E onde jamais o riso d’alma
vicejou.
Negro sepulcro, eis o nome que
te dou...
Oh! Coração de gelo e de
amargura,
Nasceste para a dor, oh!
Desventura,
E sofres como alguém que
apenas vegetou.
Desde que em meu peito,
coração, és vivo,
Persegue-te o malvado e cruel
destino,
Que te sangra num desalento
esquivo.
Carregas contigo a dolorosa
seta,
Que te faz cantar um poema
divino,
Cujos lamentos são a alma do
poeta! ( 28.10.31)
Soneto ( a Vitor Hugo – 1802-1885)
Se hoje somos efêmeros
mortais,
Pobres criaturas, sínteses o
nada,
Não devemos levar a vida
malfadada
Ao negro abismo das ilusões
fatais.
Somos vivos, amanhã não seremos mais,
Nossa vida é pobre gota dependurada
Que hoje nos braços do mundo
está ligada
E se amanhã cair não brilhará
jamais.
Amo a vida, porque é feita de
amor!
Só vive e é feliz quem souber
querer bem!
Sofra ou goze: “Amor não
avilta ninguém”!
Devemos amar; amor é o sol da
vida!
Devemos sofrer; a vida é bela
na dor!
Devemos rir, para ter a alma
florida! ( 1-11-31)
Soneto ( a Vitor Hugo)
Chega-te a mim e escuta no meu
peito
Palpitar em agonia o meu
coração!
Porque eu quero que desfrutes
o efeito
Da pobre experiência da minha
solidão.
E com amor os meus conselhos
enfeito:
Sê bondoso e terás dos justos
a gratidão;
Sê justo e terás dos fortes o
respeito;
Sê forte e vencerás afinal com
tua razão.
Sincero, rejeita sempre a
hipocrisia
Que é capaz de iluminar a
escuridão
Ou ainda ofuscar a luz do dia.
Não aceites nem desprezes um
aviso:
Pesa-o com prudência, amor e
juízo
E siga a lei nascente do teu
coração. ( 20-11-31)
Soneto
Jovem e belo, ainda no verdor
dos anos
O pobre monge era o símbolo da
paciência;
Não chorava, mas o mistério da
sua existência
Fazia supô-lo vítima de
desenganos.
É que uma vez sentira no peito
os arcanos
Do amor na sua esplendorosa
essência!
Mas o amor que julgara igual à
providência
Fora-lhe o calvário dos
martírios mais insanos.
E enclausurado naquele austero
convento
Procurara em vão minorar seu
sofrimento...
E, um dia, ajoelhado aos pés
do leito
Rezou, desesperado, esta
lúgubre oração:
“Arrancai-me oh! Deus, este
amor do coração,
Ou, louco, arrancarei o
coração do peito!” ( 10-12-31)