ANO DE 1952

Humanidade Ingrata - Os elogios ou as condenações, entre os contemporâneos, tem provocado, em seguida, manifestações tão divergentes que, na opinião da população transformam em mártires os condenados e em impostores os elogiados. A humanidade costuma ser, a seu tempo, irrefletida e ingrata e só a posteridade,de século em século, poderá julga-los com serenidade e exatidão. ( 8-1-52 )

Jesus, que sofreu a maior ingratidão praticada pela humanidade, a defender-se preferiu silenciar, implorando a Deus o perdão aos homens, que "não sabiam o que estavam fazendo". Com isso fundou a religião das religiões: o cristianismo. Eu que desejo seguir as sagradas lições de Cristo, e um dia for condenado injustamente, deverei defender-me em altos brados, não para provar a minha inocência ou acusar meus semelhantes, mas para arrancar do erro e da ignorância pobres criaturas. ( 10-1-52)

A justiça pune a todos e não premia ninguém; pune a todos que a não respeitam e não glorifica os que a cumprem. Portanto uma medida legal que visa a todos em geral e ninguém em particular. (15-1-52)

Os primeiros serão os últimos - Os primeiros a serem lembrados são, exatamente, os últimos que foram vistos... (16-1-52)

Defendamos: em primeiro lugar a FAMÍLIA; depois o nosso Município, onde vivem as nossas e as famílias de nossos amigos; depois o nosso Estado que reúne os municípios que mais conhecemos; depois a nossa estremecida Pátria... tudo em nome de DEUS, supremo Criador! Ai de quem, principalmente, no seio da família ou dentro do município, não promover a defesa necessária, como seria seu dever! Terá de baixar a cabeça, e qual moderno Caim não sentirá coragem de enfrentar, face a face, o julgamento dos que, desmascarando a indiferença, o descuido e o desmazelo, o responsabilizarem pela situação de angústia em que se achar a coletividade. ( 16-1-52 )

Povo: aglomeração onde uma ou duas pessoas começam a expor as suas idéias, como líderes e os outros apóiam, formando uma espécie de tribunal de julgamento. Varias dessas aglomerações poderão, com idéias e atos, praticar injustiças e esta fomentar rebeliões( Assim foi com Jesus, Revolução Francesa, etc.) (22-1-52)

"O maior dos ingratos é aquele que jamais sofreu uma ingratidão" - Assim é... Se o Divino Mestre, invés, de crucificado pela ingratidão dos homens, tivesse recebido o justo prêmio de seus méritos e findado seus excelsos dias, glorificado por reis e plebeus, rodeado de homenagens que merecem os heróis e os santos, pessoas essas que fazem o bem até aos seus próprios inimigos, talvez que, hoje, fosse Ele considerado apenas um "herói" ou um "santo homem". Vítima, porém, da ingratidão humana, foi mais que isso; foi Mártir. Foi herói pelo procedimento, santo pela bondade e seu martírio, agindo a guisa de contraste, realçou, de modo inconfundível e para todo o sempre, a sua figura de Homem-Deus. ( 10-2-52 )

Só desistirei de um cargo de Diretoria ou comissão se a isso me compelirem desgostos sofridos no seio de minha família. Intrigas ou calúnias, de fora, eu as saberei rejeitar. Considerarei meus pais, enquanto viverem ou meus filhos quando maiores de 21 anos, meus maiores e obrigatórios conselheiros. Portanto, a eles recorrerei sempre que as circunstâncias da vida me colocarem frente a uma situação difícil. ( 10-3-52)

Entre os homens deveria existir mais fraternidade para que todos pudessem sentir um pouco de ventura. Senão material, pelo menos moral. Acreditamos que hão de desaparecer as diferenças entre as criaturas, como já sucedeu com a extinção da escravidão branca da antiga Roma e o cativeiro do negro no Brasil. (26-5-52)

O trabalho físico não cansa se executado com moral vigorosa. Assim que sentimos redobradas nossas forças quando nossa atividade é aplicada em misteres nobres, eficientes e lucrativos. Quando, porém, sentimos dúvidas quanto aos resultados finais, quando antevemos que nosso trabalho pode redundar em fracasso, aí então, nossas forças esmorecem e sentimos um suor gélido a brotar no rosto, enquanto que, dentro do peito, uma espécie de mágoa nos aperta o coração. (7-6-52)

Enriquecer é perder a estima do povo, escrevia eu outro dia. Mas, apesar disso, para se conseguir atenção notória, no mundo, não se pode ser pobre. Mundo ingrato! Basta uma criatura ser pobre, para não conseguir, de pronto o crédito pleiteado. Enquanto que um rico (muitas vezes aparentemente) consegue favores e atenções, o pobre, que deles necessita, sofre recusas, entre evasivas e subterfúgios deslavados. Assim acontece em todos os setores de atividade humana, desde o simples operário até ao magnata das finanças. Atenção, preferências as tem os que, necessitando menos, tem maiores recursos que, naturalmente, representam assim auto-garantias. Mundo ingrato!(12-6-52)

Idéias humildes que mais parecem discursos ( não pronunciados...) - Homens portentados, magnatas ou simplesmente ricos, ouvi:
· Pensais que, negando atenções aos vossos semelhantes e aumentando, num crescente contínuo, a vossa fortuna, conseguireis, ao morrer, o respeito e a veneração de todos os vossos concidadãos?!
· Ou julgais que os vermes do sepulcro levarão em conta o vosso nome, a vossa posição social, financeira, e pouparão o vosso corpo, retardando a sua inexorável decomposição?!
· Ou será que julgais possível conseguir, sob influência do vosso dinheiro, de vossos títulos ou brazões, um lugar melhor no além-túmulo, onde a igualdade é tão real como a própria morte?
· Vossos operários sofrem e, às vezes, muito por falta de uns poucos cruzeiros?! Suas crianças padecem por escassez de um pouco de leite ou de alimento?!
· Não tendes palavras e atos de conforto para os que aguardam de vós um auxílio?!
Ah! Como estais enganados e sereis infelizes!!! ( 13-6-52 )

Elevar-se é se transformar em alvo! Assim o homem que, por seus méritos, conseguir destacar-se de seus semelhantes, logo será olhado com despeito e inveja pelos maus e apenas os poucos justos o poderão louvar. O mesmo acontece com os que ocupam lugar de juiz, chefe, patrão, etc.; muitos em sua volta pleitearão favores e beneplácitos e os que não puderem ser atendidos formarão o grupo dos descontentes caluniadores. Uma leve censura dirigida a um mau elemento provocará um gesto de revolta e aquele que pretendeu fazer justiça logo será acoimado de carrasco. E isso só poderá deixar de acontecer quando as luzes da instrução e da honestidade, iluminando as consciências, conseguirem estabelecer uma recíproca compreensão entre os homens. (20-6-52)

Como "conheci" Vitor Hugo - Freqüentava eu a Escola de Comércio "Moraes Barros", de Piracicaba, no ano de 1929, quando um dia encontrei-me com outro aluno da mesma escola, no velho jardim público daquela cidade. E, ali mesmo, na calçada fronteiriça da Igreja de Santo Antonio, debaixo de uma árvore enorme, esguia e de pouca ramagem, começamos a conversar. Nunca pude me recordar do nome daquele meu passageiro amigo, lembrando-me , porém, sempre da conversa que mantivemos e parece-me vê-lo ainda, de terno azul, atravessar a praça, afastar-se e sumir debaixo do arvoredo lateral, depois de olhar para trás e me ver, estático, absorto, no mesmo lugar em que nos havíamos despedido. É que estivéramos falando de romances amorosos e ele me dissera no final da conversa: "Eu não... eu não gosto desses romances! Eu só leio romances históricos! É pena que esses romances não são para qualquer um. A maioria não os lê porque não entendem facilmente o que está lendo, escrito. Por exemplo, os livros de Vitor Hugo são assim. A gente está lendo, de repente muda completamente, dando impressão até de que faltam folhas. Para explicar uma coisinha de nada, tem 20, 30 ou 50 ou mais páginas. Sei de muita gente que não leu até o fim, não porque os romances eram muito grandes, mas sim pela dificuldade de os compreender. Eu Não! Eu leio tudo, não deixo uma linha sequer, porque esses é que são romances elevados, neles é que se nota a inteligência, a sabedoria e a capacidade do escritor..." Aquelas palavras me impressionaram tanto que, meditando sobre as virtudes de tais romances eu fiquei ali imobilizado, encantado! Anos depois, achando-me em Santos, deparei com um livro do "misterioso" escritor. Não há dúvidas que comprei o volume - O Homens do mar - demorando muito para terminar a sua leitura, um ano talvez. Mas, me agradava tanto a sua maneira de descrição que eu assinalava todos os trechos, as sentenças, os pensamentos que mais fundo calavam em meu espírito. Mais tarde o reli, e comprei novos volumes do mesmo autor, e tão grande se tornou minha admiração por seus escritos, que em todas as livrarias que eu visitasse, ia logo perguntando: " Tem aí algum livro de Vitor Hugo?" Foi assim que, através de palavras singelas de um amigo anônimo travei conhecimento com as obras de Vitor Hugo e aquele meu amigo, no dizer do próprio pensador francês se assemelhou ao humilde lanterneiro que, andando pelas estradas da vida, em noites escuras, iluminava, não só a sua rota, mas também, sem o querer, as coisas que se achavam à margem do caminho. (20-6-52)

Riqueza - É engraçada a vida que a gente, que muita gente leva. É, como se costuma dizer, uma luta! Tem-se 10 cruzeiros e se deseja 20. Sendo 100 se ambiciona 1.000. Quem possui um milhão, da mesma forma deseja mais. Diz o homem rico: "o que tenho é meu e não posso perder; se alguém tentar me prejudicar, recorrerei à justiça". Assim, muitos vivem em sobressaltos. Uns para ganhar, outros para não perder. Porque somar é uma forma de não deixar diminuir. De qualquer forma é sempre uma luta. Se, entretanto, achamo-nos em perigo de perder 100, então lutaremos para perder só 5. E, no final, tenha o que tiver, o homem deixará tudo! É possível que o corpo ainda não esteja gelado e já se tenha iniciada uma outra luta: a da partilha! E não seria para se indagar: teria importância deixar 10, 20% a mais ou a menos? Entretanto, as criaturas humanas vivem em constante luta: a defesa do dinheiro! ( 20-8-52 )

Nosso coração será mais feliz se nele existir Piedade; piedade que invoca perdão aos pobres de espírito e caridade aos necessitados de recursos materiais. (30-8-52)

Se não pudermos ter espírito de sacrifício (para ultrapassar os nosso deveres) tenhamos, ao menos, o espírito de renúncia (para abrir mão de nossos direitos) sempre que o bem comum o exigir. (10-9-52)

A maior parte dos homens prefere agradar a maioria poderosa! Se Pilatos, que dispunha do poderio, quisesse ter sido honesto, teria impedido a morte de Jesus. E assim, pelo contrário, deveria ter ordenado que o povo seguisse o Mestre, seus ensinamentos de paz, amor e perdão! Mas, é que a populaça, cúmplice dos despeitados sacerdotes, estava possuída da volúpia do mal e ao governador da Judéia interessou mais a sua posição política perante os homens, do que a sua consciência perante a verdade, perante Deus! ( 10-9-52 )

Todos nós temos Direitos e Deveres. Cada dever que cumprimos é um peso colocado num prato de balança de justiça. Mais peso no prato dos Deveres mais alto se elevará o prato dos Direitos. Quem quiser cumprir suas obrigações sociais terá que descer à terra, aos seus semelhantes. E, como uma semeadura generosa, verá brotar do solo a semente germinada e vendo-a crescer para o céu, para Deus, colherá do alto os seus frutos abençoados. (20-9-52)

Religiões - Como há imitações de tudo quanto existe, inventaram também várias de Deus e deram-lhe o nome de "religião". Como qualquer imitação, as do Criador Todo Poderoso revestem-se de todas as virtudes do próprio Deus; assim, qualquer religião é por origem e fundação, boa, mas no fundo não deixa de ser imitação, e não escapa, se estudada atentamente, de ter defeitos congênitos. Por isso não combato nenhuma religião e reconheço que Deus é Deus, suprema perfeição, sabedoria e bondade! E dizer-se que, neste mundo, há homens letrados, que se dizem sábios (pobres sábios) que não crêem em Deus! ( 6-10-52 )

A expressão real do nosso valor está na diferença entre o maior contingente de espírito de sacrifico e o volume de nossos erros. Assim um homem que erra poderá ter centena de vezes mais valor do que um virtuoso que, afinal, não se pondo em campo, amiúde, na prática do bem, está a salvo da possibilidade de erros, mal-entendidos e até calúnias. (23-10-52)

Existem três categorias de homens inatacáveis. Os indiferentes, os virtuosos e os caridosos. Há, porém, uma quarta categoria que é realmente digna de lembrança, a dos abnegados.Senão vejamos: os indiferentes são os que vivem à margem dos fatos, não trabalham, não são a favor nem contra as iniciativas de seus semelhantes. Cumprem seus deveres, nada mais. Os virtuosos são os que, por suas práticas religiosas e sociais bem demonstram seu amor a Deus e seu respeito aos direitos dos cidadãos. Os caridosos são os que, sem serem indiferentes ou apenas virtuosos, praticam o sagrado dever da caridade, auxiliando seus semelhantes a carregarem o pesado fardo da vida. Porém a quarta categoria, além de virtuosos e caridosos, são abnegados e progressistas e acima de seus interesses pessoais colocam o interesse da coletividade, parte integrante que são da mesma coletividade e beneficiários, portanto, de um almejado mundo melhor. (10-11-52)

Morrer! Que vale viver 10 ou 20 anos a mais ou a menos, se considerarmos a eternidade do tempo? Oitenta anos que uma criatura vive é um relâmpago, um milésimo de segundo na noite misteriosa que antecede ou sucede esta existência. Conformai-vos, pois, vós que, ao morrer, ides descortinar, talvez, os mistérios que tanto pavor causam a muitos que ficam aqui esperando a sua vez. ( 21-11-52 )

A morte - O falecimento é uma questão de tempo. Ninguém deveria se alarmar com a chegada da grande ceifadora. É pena que a morte viesse interromper uma juventude feliz, sonhadora, quando a criatura já tem mais de 15 e menos de 26! Morrer, isso é fatal! Uns agora, outros depois; "cada dia que vivemos é um dia a menos de vida"... "cada passo na vida é um passo a mais ao encontro da morte". Mas, afinal, há de existir, no além túmulo, uma "continuação" desta vida! Não pode desaparecer no nada, assim simplisticamente, a inteligência e a bondade de tanta criatura humana (exceção a nós que nada estudamos, nada sabemos e nada fizemos). Cristo, Vitor Hugo, Santos Dumont, Marconi, Castro Alves, que, por suas palavras e atos desejaram um mundo melhor, não desapareceram assim, como folhas mortas, levadas pela correnteza dos tempos! Não! Como existe o despertar do sono dos vivos, há de existir o despertar do sono dos mortos. Qualquer coisa, enfim, que seja continuação ou pura conseqüência da existência terrena ( 12-12-52 )