ALEGRIA

 

A felicidade deve ser um reflexo e nunca uma luz. A luz, em certos casos, poderá produzir a cegueira, como o calor poderá produzir queimaduras. Sim, a nossa felicidade deve ser um reflexo da felicidade alheia, essa alegria que se desfruta entre os venturosos, com pensamentos elevados entre os otimistas e grandes de espírito! Não se compreenderia jamais que alguém quisesse ser feliz em meio a uma catástrofe, e que desse gargalhadas entre lamentações de desgraçados! Esse estaria louco ou não teria coração! (7-4-51)

E a vida continuará! Desde que o mundo é  mundo quantas desgraças tem as criaturas humanas suportado, percebendo após a tormenta, que “tudo passa” e que o tempo, grande médico, professor, mágico, tudo cura, tudo ensina, tudo resolve. “Morrer não é nada; deixar de viver é que é medonho” disse Vitor Hugo. E é verdade. Porque não vivendo deixamos de participar das alegrias e tristezas que cercam a vida dos nossos entes queridos A nossa vida se resume no convívio entre nossos semelhantes. Não vivendo mais, uma falta será sentida pois, mesmo idosos, quando bons  e justos, sempre poderíamos ser úteis, aos que nos cercam. Simples conselhos valem muito aos que são moços. E os que morrem deixam de padecer, pois a agonia há de ser um sofrimento, e nem se poderia admitir a morte provocando ânsias de gargalhadas. Portanto, a criatura deixa de sofrer após o desenlace. Mas, e os que ficam no mundo? Chorarão desde logo, chorarão de saudades depois, sofrendo em suma, sem o nosso consolo. E depois, nossos dias virão, o tempo irá passando; novas esperanças, novas tristezas, novas decepções, novas ilusões, e na realidade dos dias que irão passando todos reconhecerão: a vida continuará! (8-5-55)

Pena de Morte — A justiça não pode, a  princípio, perdoar os criminosos. Seu funcionamento há de ser como o de um filtro, que, deixando passar a pureza, separará a maldade. Se os maus obtivessem livramento acabariam desestimulando, pervertendo ou exterminando os bons. Mas nada de pena de morte! “É uma vingança estúpida praticada em nome da justiça”, cuja missão, em verdade, é absolver ou condenar, sem matar ninguém. E perguntamos: será a morte uma condenação? Não seria, para o criminoso, o fim de seus sofrimentos e (...) , em prisão perpétua, mas vivo. Morto, talvez, seja esquecido mais depressa, perdendo-se, inclusive, para sempre, a possibilidade de faze-lo arrepender-se e “trazer aos Céus mais alegrias pela sua conversão do que a perseverança de 99 justos”. Portanto, criminosos verdadeiros são ( ou serão considerados em futuro próximo) os juízes, os sábios, os doutores da lei que demorada e meticulosamente  deliberaram interromper a vida de um semelhante — criatura de Deus! Não! A justiça que sacrificou Jesus, Joana D’Arc, Tiradentes, não era no seu tempo “justiça”!? Não! Neste século XX, em que o homem revelou tanta inteligência, inventando, criando, descobrindo e aperfeiçoando prodigiosas maravilhas em benefício da humanidade, e chega agora ao supremo interesse de sondar se existe vida em outro planeta, não poderia, esse mesmo homem querer, aqui na terra, voluntariamente, matar o seu irmão! ( 16-7-59)

A felicidade é, em primeiro lugar, um estado de alma em que a criatura sente uma espécie de heróico conforto após o cumprimento do dever. Por isso que a saúde, a beleza, o bem estar, a boa forma são apenas complementos. Esses atributos não garantem, sozinhos, a felicidade que, entretanto pode subsistir independente dos mesmos. Basta que a criatura humana, apesar de sofredora, sinta-se tangida por um idealismo sublime para considerar-se eufórica, feliz, na mesma situação em que sorridentes enfrentavam a morte os mártires cristãos, nas arenas romanas. Ao contrário da alegria gargalhante, a felicidade verdadeira não é transitória, porque se funda no estoicismo, na bondade, na justiça e na firme crença em Deus. ( 12-3-61)

Soneto

Bendita Democracia! Oh! Santa Liberdade

que reconhece ao homem o direito de pensar,

o direito de reunir, o direito de falar

com a franqueza magnífica da Verdade.

 

Bendita Democracia! Regime de Igualdade

que garante às criaturas direito d’esperar

o prometido “mundo melhor” e nele desfrutar

todas alegrias da mais pura Eternidade.

 

Bendita Democracia! Que abomina a opressão

e que estabelece ao governo e aos governados

leis que correspondem aos anseios da população.

 

Bendita Democracia! Sustentáculo da luz

que há de conseguir com que os homens irmanados,

sigam os excelsos ensinamentos de Jesus! ( 1-6-61)

E quando lhe disseram que para combater o comunismo o essencial era colocar “gente nossa” nos parlamentos, o pobre homem refletiu assim: “Engano! Isso seria apenas tentar contornar os efeitos. Uma espécie de paliativo, de escassa utilidade, como inútil seria ministrar soro e oxigênio a um moribundo para prolongar-lhe a existência. O ideal seria descobrir e medicar a causa da enfermidade. Portanto a repressão ao comunismo deve ser feita dando aos desamparados alguma esperança, entremeada com assistência efetiva, melhor salário, melhor alimentação, melhor habitação e recursos outros a fim de, com algumas sobras, desfrutar das alegrias proporcionadas pela aquisição razoável de seus móveis e imóveis, privilégio que tem sido reservado à burguesia, não proletária, das cidades e dos campos”. ( 22-3-62)

Pesadelo II — Havia estourado nova revolta popular. O terror imperava na cidade. As autoridades todas haviam sido fuziladas, pisoteadas. A turba, sedenta de sangue, proclamava que só pouparia  os proletários do campo e da cidade. Os outros, ou pelo menos uma pessoa  de cada família, seriam “justiçados”. Era o tributo com que pagariam as passadas alegrias em seus lares, onde nunca faltou pão. O pelotão de fuzilamento achava-se em frente de sua casa. A algazarra da rua era ensurdecedora. Os soldados com os uniformes em desalinho, olhares flamejantes de ódio, apontavam os fusis, com as baionetas caladas, para todos os lados. Pedradas faziam as portas e janelas se abrirem com estrondos. Móveis eram incendiados assim que atirados à rua, clareando com luz bruxoleante semblantes suarentos. Gritos de histerismo se misturavam com choros de crianças apavoradas, num tumulto indescritível. No céu escuro da cidade fumarenta explodiam focos de luz, como pirilampos ruidosos. Outras bombas mais fortes estouravam iluminando o espaço, depois de levadas ao alto por serpentes faiscantes que se desfaziam como milhares de minúsculas estrelas cadentes. Tudo aquilo dava impressão de uma festa macabra e infernal. Foi quando um homem corpulento, estremecendo-se todo, bradando uma, duas, três vezes, erguendo-se e girando na ponta dos pés: “Silêncio! Silêncio! Silêncio!” . Aos empurrões formou-se em seu redor um vazio e o brutamontes ficou sozinho como que num picadeiro e ameaçando disparar o fusil-metralhadora que portava, foi conclamando: “Agora eu quero silêncio! Vamos subjugar mais um ‘granfino’. Silêncio! O primeiro que atirar mais uma pedra receberá uma rajada de balas”. Já então todos os olhares convergiam para o terraço da casa, onde um homem de meia idade, com os braços abertos, adiantou-se,e com voz firme, falou: “Estou pronto para sofrer a condenação...”. “Não, o candidato a morrer não é você , mas seu filho, que desacatou o nosso regulamento. Em vez de entregar a chave do seu automóvel,  atirou-a fora fazendo com que a mesma se perdesse nos destroços  das sarjetas” . Quem deve morrer sou eu. Sou responsável pela educação e até pelo temperamento do meu filho. Ele tem o meu sangue e a minha alma”. “Mas você tem outros filhos para criar”. “Um irmão criará o outro irmão. Na falta de irmãos, a Sociedade ou o Estado avocará a si a obrigação da defesa das crianças. Ninguém é insubstituível, repito aqui”. “Entretanto, no novo regime, todas as famílias deverão ter um chefe; o governo não manterá nem orfanatos, nem albergues, nem asilos...”. “A chefia, como quaisquer ações, vem em função da necessidade. Um adolescente investido de autoridade cumprirá seus deveres com bravura”. E os seus negócios? Só você os conhece...” . “Os que ficarem ou vierem depois vasculharão livros e consciências e decifrarão todos os mistérios aparentes. Ademais, os moços precisam viver. Eles tem o idealismo no cérebro e o gérmen do progresso nos músculos. Os velhos poderão apenas ministrar ensinamentos. Mas a sabedoria não é patrimônio de ninguém. É um edifício imenso, que vem sendo construído desde a aurora do mundo, com milhões de pequenas pedras — idéias que se renovam em busca da perfeição. E os moços, imbuídos dessas idéias lutarão por um mundo melhor, procurando fazer com que a fraternidade se aposse  de todos os corações e assim...”. Ninguém mais, nem ele próprio, podia ouvir as suas palavras; começou com a impaciência em todos os olhares, depois cochichos, depois acotovelamentos, depois esfregação de pés no asfalto, depois vozerio, depois altos brados uníssonos, simultâneos com gestos cadenciados e o clamor de “morra o velho! Morra o velho!” foi crescendo avassaladoramente como se fosse um furacão. Nesse momento houve como um estremecimento e o pobre homem despertou, sentindo escorrer-lhe pelo corpo o suor frio dos agonizantes enquanto dentro do peito seu coração palpitava com aquela heróica alegria que deve dar sentido aos mártires na hora da morte. ( 19-4-62)

Negócios novos que devam ser cuidados por aqueles que já os possuem muitos, alguns mal assistidos, são como filhos adotivos em lares pobres, sem recursos suficientes para os seus. Poderão as crianças adotadas, desde logo, trazer alegrias e mais tarde até recompensas, mas de imediato ficarão os tutores sujeitos a críticas e, no futuro, a remorsos se a realidade vier a desdourar a insólita iniciativa. ( 12-6-62)

“Agora que eu estava tão contente!” ¾ É o que a pessoa sofrendo uma infelicidade maior, espécie de “pequena tragédia”, então, em meio de suas lamentações lembra-se das alegrias e benefícios obtidos nos últimos tempos. Não fosse, entretanto, o “desastre”, continuaria incontentada, ambicionando sempre mais. Mas, refletindo agora, do fundo de sua dor, assumindo uma posição de mártir diz: “Agora que ia começar a ser feliz...” ( 14-12-63)

Existem sacrifícios que deprimem e outros que dignificam. Uns são frutos de serviços refeitos, porque o empenho inicial foi mal sucedido ou precipitado e outros porque representam vitória sobre dificuldades. Os sacrifícios dignificantes são verdadeiros “sal da vida”, tão necessário e sempre confortante para aqueles que, enfrentando situações adversas, desfrutam depois, embora momentaneamente, exaustos das alegrias de sentir-se bem, à custa de seus próprios esforços.

(03-05-66)

Existem pessoas que se preocupam tanto com o que acontece no momento, ou com o que pode acontecer no dia de amanhã que destroem as alegrias de suas vidas. São certos pescadores, de beira de repesa ou riacho, que conheci na minha infância, que contavam as minhocas que levavam, os peixes que fisgavam e os que perdiam, com tal preocupação que a humilde pescaria, para eles, em vez de entretenimento e higiene mental, era um suplício de expectativa e decepção. E de nada valiam as suas lamúrias contra os peixes ocultos e as águas serenas... Assim são também os avarentos e similares que não desfrutam os bens da vida apenas porque só pensam em ganhar recursos e bens materiais,e em aumentá-los sempre e se aborrecem com aquilo que deixam de lucrar e tanto mais se outras criaturas com mais sorte, raciocinam, lhes podem passar a frente. E, nesse eterno sobressalto deixam de bem viver, amistosa e harmoniosamente entre, o “momento presente que passa e não volta mais”. ( 29-05-66)

A felicidade, como fruto de nossas próprias ações é, em suma, uma criação nossa, e assim uma situação por nós almejada ou prevista, que vimos nascer, crescer, adquirir perfil, forma e enfim existir em sua plenitude. Um dia poderá, entretanto, afastar-se de nós, por nossa culpa ou omissão, ou ainda, por culpa ou omissão de quem, conosco,  ajudou a construir esse “sentimento de felicidade”. Mas, como o Filho Pródigo da Bíblia ( que não cometera nenhuma falta grave) tal felicidade deverá um dia voltar e aí então, em vez de zangas, justo será demonstrarmos grande e verdadeiro contentamento, indo até às lágrimas, reflexo de santas alegrias, usufruídas por aqueles cuja ventura esteve extraviada por algum tempo e depois foi re-encontrada. ( 14-1-68)

Quando um homem pode considerar-se realizado? É muito relativo o problema. Se perguntarem isso a um jovem, que então já poderá ter idéias de homem feito, o mesmo dirá que é “tirar o diploma”, exercer uma profissão agradável e lucrativa,e assim colocar-se na vida e vencer. Para outro jovem seria casar-se com a mulher de seus sonhos e daí passar a viver no céu... Para um homem chefe de família é ver seus filhos emancipados e auto-suficientes,em alto nível. Na maior categoria estão os que querem ver seus descendentes casados e bem. Mas, como existem cidadãos que não se casam, os seus pais não deixarão de ser “homens realizados”, devido o celibato dos próprios filhos. Entretanto, para a maioria, “homem realizado” deve ser aquele que, tendo vivido mais de 50 anos ( idade comum de aposentadoria), sente, dia a dia, todas as alegrias e emoções de uma existência honesta, difícil, útil, e que, portanto, no dizer do poeta: “Não passou pela vida em branca nuvem”... ( 6.3.68)

Altruísmo é um privilégio para quem estiver em condições de praticá-lo; “não-egoísmo” ¾ como símbolo de humildade, estoicismo e renúncia ¾ é apenas uma santa alegria ao alcance de todos quantos, grandes e pequenos, vivem em sociedade, com disposição de não magoar os seus semelhantes. ( 28-9-70)

“As pobres crianças” e os “pobres velhos” ¾ Sempre as crianças tem pai e mãe, ainda que pobres e infelizes. Mas, os tem! Ou, pelo menos, padrinhos, ou tios, ou avôs, ou parentes longes. Às vezes, até certos vizinhos gostam de fazer um pouco de “santa demagogia”, protegendo crianças necessitadas... Na maioria dos casos, o problema urgente das crianças  se resolve com alimento e roupa, e para isso logo são lembradas e convocadas as inúmeras associações de assistência à infância que existem nas cidades grandes e pequenas. Por último há que se mencionar que as crianças, em virtude da potencialidade de seu físico juvenil, retornam facilmente à alegria e ao bem estar, querendo alguém... E os pobres velhos? Quase cegos, sem dentes, mãos trêmulas, enfim enfermos dos pés à cabeça, tem o pensamento perdido nas névoas das recordações distantes... de quando eram moços e trabalhavam, e amavam e sorriam, felizes, quem sabe?, na sua divertida pobreza!!! E agora quase que sozinhos, num asilo ou num quarto obscuro, ou de léu em léu, vão sentindo o peso da solidão e do abandono. Por vezes, complacentes e comovidos vão assistindo o tempo passar até que, após o momento extremo, alguns dos seus últimos amigos, venha comentar, referindo-se ao pobre morto que tem diante de si: “foi melhor assim... descansou...  ( 5-12-70)

Todas a alegrias que podíamos receber de um filho, até o momento em que o Bom Deus o chamou ao seu reino, foram nos proporcionadas, bem como julgamos lhe havermos proporcionado todos motivos de felicidade possíveis a um casal de pobre velhos pais, como nós. ( 11-3-1973)

Era uma vez um menino, de nome Joãozinho, que morava num sítio bem arborizado, perto da cidade. Como qualquer criança residente na zona suburbana, o menino possuía algumas gaiolas com pequenos pássaros. E numa manhã, enquanto Joãozinho tomava café com leite na cozinha de sua casa, estando a janela aberta, ouviu um canto novo de passarinho e, saindo fora, viu um pintassilgo solitário que, num galho alto da laranjeira trinava alegremente, dando bem para ver o seu bico entreabrindo-se enquanto movia a cabecinha para os lados. Nas manhãs seguintes o pintassilgo voltava a cantar na mesma laranjeira e tão lindo eras seu canto que Joãozinho perguntou ao pai como fazer para caçá-lo e assim poder, dando-lhe alpiste e água limpa, nos dias seguintes, ouvir o seu lindo canto, em companhia de seus amiguinhos. E, tendo feito como seu pai lhe ensinou, depois de prender o passarinho no alçapão, transferiu-o para uma gaiola nova, na qual havia colocado antes uma vasilha com alpiste e outra com água limpa. Mas.. o pobre pintassilgo não cantou mais, nem mesmo quando, a conselho do pai, a gaiola era pendurada num galho daquela laranjeira perto da cozinha. Às vezes, antes de recolher a gaiola para dentro da casa, a hora do crepúsculo, Joãozinho tinha a impressão de ouvir seu querido pintassilgo cantar baixinho, sem se mexer, dando a impressão de que estava dormindo... Mas, ao mais leve ruído de sua aproximação, o pássaro estremecia e, a partir daí, só se ouvia nas árvores vizinhas o piar de outros passarinhos que procuram abrigo nas ramagens. Então Joãozinho recolhia a gaiola e na manhã seguinte a recolocava no galho da laranjeira, sempre com esperança de que, ali, o seu passaria voltaria a cantar... Os dias foram passando e numa tarde Joãozinho se esqueceu de recolher a gaiola, e na manhã seguinte, com muito remorso e tristeza em seu coração, verificou que o pássaro havia desaparecido da gaiola e achado até que o malvado gato do vizinho o houvesse devorado... E a gaiola ficou vazia muitos dias até que numa bela manhã escutou novamente, partindo daquela laranjeira o canto de outro pintassilgo, tão afinado e forte como o do que estivera preso por poucos meses. E sentiu em seu coração o desejo de armar de novo o alçapão para caçá-lo, como fizera com o que havia desaparecido, Quando isso aconteceu verificou por uma verruga que possuía na perninha esquerda que era o mesmo pintassilgo e também porque ao ser colocado na gaiola não se debateu, como fazem os pássaros recém capturados. Era igual em tudo, apenas com a cabecinha mais preta, concluindo assim que efetivamente era o mesmo. Mas, infelizmente, não voltou a cantar, como fazia até poucos dias, quando empoleirado no galho da laranjeira. E o pai, vendo o Joãozinho tão triste com isso, deu-lhe este conselho: “Solte-o, pois a falta de liberdade, ou seja daquilo que deseja, tira-lhe a alegria e a vontade de cantar. Com as criaturas humanas também acontece o mesmo quando lhes falta alguma coisa agradável, com a qual conviveram muito tempo, perdem a inspiração e o desejo de demonstrar alegria”. E o autor dessa humilde história continuava meditando: “Não serão os meus pobres livros , que ficaram em Rio das Pedras, na chácara, uma espécie de arvoredo, onde minhas idéias gostariam de, novamente, beber inspiração e respirar liberdade de meditação?” ( 22-3-81)

Somente em 1970, mais ou menos em março, depois que adquiri um Dodge-Dart modelo novo, um dos primeiros que foram expostos no salão de vendas de revendedor local ( Piracema). É que comecei a perceber, entre alguns velhos conhecidos,  a atribuição de relativo prestígio pessoal e então fui convidado, pela primeira vez,  depois de quase quinze anos ( 12-01-56) de Lions Club Piracaba-Centro, a ocupar um cargo de Diretoria ( 2º tesoureiro). E percebia que, em verdade, o “Zé-povão” prestava mais atenção em um Dodge-Dart-70 do que em mim próprio e foi a partir daí, associando minha pessoa, meu nome, como “dono do carrão novo”, é que comecei a ser considerado “respeitável”, “importante”, etc.... No ano seguinte fui eleito, surpresa enorme para mim e para minha querida “domadora”, presidente desse prestigioso clube de serviço, cujo cargo desempenhamos com significativas realizações e, ao final do mandato, em junho de 1972, comparecemos à Convenção Internacional na Cidade do México, e, depois de conhecer várias cidades mexicanas, fizemos um tour pelos Estados Unidos, em companhia de um grupo de Leões gaúchos, com os quais mantemos até hoje sincera amizade. Nosso ano leonístico (julho de 71 a junho de 72) foi para nós de muitas alegrias e, porque não dizê-lo, até de orgulho, pois fizemos novas amizades aqui em Piracicaba, mantidas até hoje,com muito carinho. Depois disso tenho sido até convidado a aceitar “honrarias” especiais, títulos nobiliárquicos, desses que, dizem, é possível obter-se pagando alguns milhares de cruzeiros, em troca... Felizmente, sempre recusei tais honorabilidades, mas do “prestígio” que comecei a desfrutar, a partir do “carrão novo”, não tenho podido desvencilhar-me , até hoje, quando me chamam de “doutor” e coisas mais!!! ( 21-04-81)

“Se queres a paz, prepara-te para a guerra”  ( “Si vis pacem, parabellum”) ─ Existem dois tipos essenciais de paz: a paz interior, a paz de espírito e a paz social, a paz externa, da qual somos parte também, permanentemente. A paz de espírito, interior, podemos controlar, gozá-la em muitos momentos, alguns até dos mais difíceis. Mas, se não houver paz externa, social, em que nós próprios, nossos familiares, nossos amigos e outras inocentes criaturas são prejudicadas, ofendidas, agredidas, martirizadas, desaparece paulatina ou instantaneamente a nossa paz interior... Por isso que somente poderá existir maior percentagem da paz sobre a face da terra, e isto repetimos sempre: apenas quando os governos, suas forças armadas, quando os homens de todas as raças, das mais diversas condições sociais, quando todos forem justos, honestos, trabalhadores, generosos e usando a inteligência que Deus concedeu a cada um, seguirem os ensinamentos de Cristo Jesus. Paz absoluta, perfeita, integral, nunca existirá entre os homens, porque estes, pela lei da própria natureza, devem desenvolver seus ciclos de vida, entre sofrimentos e alegrias, acertos e fracassos, para um dia deixarem o convívio de seus entes queridos e aí sempre haverá inevitável tristeza nos corações... ( 20-2-83)

Em muitos momentos da vida, o homem, especialmente quando percebe estar ingressando na velhice, tem impressão de sentir-se só, mesmo vivendo no seio de sua família, no meio de amigos. Entre estranhos, em contato com pessoas que são, talvez reciprocamente indiferentes, a solidão parece aumentar, porque com estas pessoas nada existe sobre o que dialogar, propor, ouvir. Nessas oportunidades a pobre criatura faz um retrospecto da própria existência, do seu passado de esperanças, anseios, de algumas frustrações sofridas e até de duras realidades que teve ou tem de suportar. Mas o homem não poderá sentir-se plenamente só ou abandonado se, crendo em Deus, existir ao seu lado, ao seu alcance, esteja onde estiver, algum meio de comunicação, que lhe faça presumir uma resposta, uma solução, ainda que aleatória. Assim, jamais sentir-se-á só quando, numa suprema devoção ou conformação, voltar o seu pensamento ao Onipotente e, orando, entregar-lhe seus momentos futuros, rogando sempre para que seus entes queridos encontrem as santas alegrias que a vida, enquanto jovens ainda, pode lhes proporcionar. ( 19-5-89)