SOFRIMENTO

 

Soneto

Jovem e belo, ainda no verdor dos anos

O pobre monge era o símbolo da paciência;

Não chorava, mas o mistério da sua existência

Fazia supô-lo vítima de desenganos.

 

É que uma vez sentira no peito os arcanos

Do amor na sua esplendorosa essência!

Mas o amor que julgara igual à providência

Fora-lhe o calvário dos martírios mais insanos.

 

E enclausurado naquele austero convento

Procurara em vão minorar seu sofrimento...

E, um dia, ajoelhado aos pés do leito

 

Rezou, desesperado, esta lúgubre oração:

“Arrancai-me oh! Deus, este amor do coração,

Ou, louco, arrancarei o coração do peito!( 10-12-31)

 

Admite-se que o sofrimento pela dor jamais pelo desamparo. Sofrimento frente a males incuráveis, jamais por enfermidades sem medicação.Não se compreende haja fome  por falta de alimento e ignorância por falta de instrução. (30-4-51)

 

E a vida continuará! Desde que o mundo é  mundo quantas desgraças tem as criaturas humanas suportado, percebendo após a tormenta, que “tudo passa” e que o tempo, grande médico, professor, mágico, tudo cura, tudo ensina, tudo resolve. “Morrer não é nada; deixar de viver é que é medonho” disse Vitor Hugo. E é verdade. Porque não vivendo deixamos de participar das alegrias e tristezas que cercam a vida dos nossos entes queridos A nossa vida se resume no convívio entre nossos semelhantes. Não vivendo mais, uma falta será sentida pois, mesmo idosos, quando bons  e justos, sempre poderíamos ser úteis, aos que nos cercam. Simples conselhos valem muito aos que são moços. E os que morrem deixam de padecer, pois a agonia há de ser um sofrimento, e nem se poderia admitir a morte provocando ânsias de gargalhadas. Portanto, a criatura deixa de sofrer após o desenlace. Mas, e os que ficam no mundo? Chorarão desde logo, chorarão de saudades depois, sofrendo em suma, sem o nosso consolo. E depois, nossos dias virão, o tempo irá passando; novas esperanças, novas tristezas, novas decepções, novas ilusões, e na realidade dos dias que irão passando todos reconhecerão: a vida continuará! (8-5-55)

 

Pena de Morte — A justiça não pode, a  princípio, perdoar os criminosos. Seu funcionamento há de ser como o de um filtro, que, deixando passar a pureza, separará a maldade. Se os maus obtivessem livramento acabariam desestimulando, pervertendo ou exterminando os bons. Mas nada de pena de morte! “É uma vingança estúpida praticada em nome da justiça”, cuja missão, em verdade, é absolver ou condenar, sem matar ninguém. E perguntamos: será a morte uma condenação? Não seria, para o criminoso, o fim de seus sofrimentos e (...) , em prisão perpétua, mas vivo. Morto, talvez, seja esquecido mais depressa, perdendo-se, inclusive, para sempre, a possibilidade de faze-lo arrepender-se e “trazer aos Céus mais alegrias pela sua conversão do que a perseverança de 99 justos”. Portanto, criminosos verdadeiros são ( ou serão considerados em futuro próximo) os juízes, os sábios, os doutores da lei que demorada e meticulosamente  deliberaram interromper a vida de um semelhante — criatura de Deus! Não! A justiça que sacrificou Jesus, Joana D’Arc, Tiradentes, não era no seu tempo “justiça”!? Não! Neste século XX, em que o homem revelou tanta inteligência, inventando, criando, descobrindo e aperfeiçoando prodigiosas maravilhas em benefício da humanidade, e chega agora ao supremo interesse de sondar se existe vida em outro planeta, não poderia, esse mesmo homem querer, aqui na terra, voluntariamente, matar o seu irmão! ( 16-7-59)

 

Fraternidade ¾ Nos debates entre marido e mulher, entre pais e filhos, entre irmãos, enfim, nos debates no seio de uma família virtuosa e cristã não pode haver revanche, nem vencedores e vencidos... A nobreza, a renúncia,a condescendência devem encobrir com véu de silêncio aquilo que, se continuado ou repetido,  provocaria mágoas, sofrimentos e desastres, que a ninguém beneficiariam... Essa mesma mentalidade deve ser adotada, por analogia,  entre verdadeiros  amigos e sócios, certo de que eles devem tratar-se como irmãos. ( 25-11-65)

 

Não são os sofrimentos nesta terra nem as boas ações aqui praticadas que, simplesmente, garantem aos homens a sua entrada no reino de Deus. É que o sofredor pode ser um revoltado, blasfemo, e até vingativo, do mesmo modo que o “generoso”  pode ser um hipócrita, demagogo e até velhaco. Assim, só merecerão os Céus – perante Deus e a própria consciência – aqueles que sofrerem estoicamente e praticarem com espírito cristão, sinceras boas ações, possíveis a todas as criaturas, sejam elas ricas ou pobres, felizes ou desventuradas. ( 26-9-68)

 

Em matéria de caridade, todos temos nossos “necessitados particulares” muitos dos quais comparecem habitualmente a nossa porta, pedindo roupas usadas, alimentos,e algumas dessas pessoas são até nossas conhecidas antigas, compadres, “parentes longes”... Mas isso não pode, em absoluto, motivo de recusa de colaboração aos necessitados avulsos, ou as campanhas populares que se fazem no Natal, no inverno, bem como aquelas que, ocorrendo uma calamidade pública (enchentes, secas, incêndios, desabamentos) são promovidas para minorar os sofrimentos dos atingidos pelo infortúnio. Em verdade, é uma grande desgraça que os governantes ( federais, estaduais, municipais, etc.) não tomem a si, na maior parte, a obrigação de socorrer aos necessitados em geral, forçando-os então a, humilhados, recorrerem à “generosidade popular”... Entrementes, é uma desventura ainda maior aquela provocada, nessas ocasiões, pela atitude de certos “ricos” ¾ os tais a que se referiu Jesus Cristo no Sermão da Montanha ¾  e que, também por isso, não estarão no Reino dos Céus! (12-4-70)

 

O sofrimento humano é agora muito menor do que há 100 anos, quando Fleming (1881-1955) não havia ainda nascido e Pasteur (1822-1895) começava a desvendar os mistérios dos microrganismos e punha em prática eficientes  métodos de prevenção e combate às infecções bacterianas. Portanto faz pouquíssimo tempo que o mundo sofredor passou a se beneficiar com as descobertas da moderna medicina. Aqui mesmo, em nosso querido Brasil, no início desta fabuloso século XX, quase houve uma revolução, quando a maioria da população da Capital de República recusava-se a aceitar a política saneadora do diretor da saúde pública, Oswaldo Cruz ( 1892-1917) que havia, com o apoio do presidente Rodrigues Alves instituído a vacina obrigatória. Tal disposição teve de ser revogada em 1904 sob ameaça de derrubada do Governo! Mas, como dizíamos, não há dúvida que o sofrimento humano é agora menor do que mesmo há 50/100 anos. No passado ¾ além da ignorância, da miséria, do desamparo social, do atraso da medicina, da ausência da eletrônica e da moderna mecânica ¾ o homem era explorado pelo próprio homem porque não existiam leis que condenassem tal exploração. Hoje, entretanto, em pleno último terço do século XX, como as velozes máquinas de produção fazem riquezas gigantescas e são poucos os homens que fazem fortuna assim rapidamente, os outros, os operários, que ficam muito para trás, analisam a situação e reclamam, comparando-se com os poucos privilegiados... E os que reclamam, protestam, fazem escândalo, não são os “miseráveis”, certo que estes, inclusive, são tímidos, apáticos, parecendo até conformados... A verdade é que o mundo de hoje é menos sofredor que o de ontem e o mundo do amanhã estará mais próximo da inatingível perfeição... Só o tempo poderá ir corrigindo a mentalidade daqueles que, por culpa própria, não entendem que “somos todos irmãos” (25-5-70)

 

Oração ¾ Perdoai-nos, ó Deus nosso, se a partir das 22 horas do último domingo, dia quatro, quando uma grade dor se abateu sobre nossas vidas de pai e mãe. Sim, perdoai-nos, ó Deus onipotente, se em face do enorme sofrimento de nossos corações, junto com os soluços que subiam do nosso peito, junto com as lágrimas que continuam inundando os nossos olhos, perdoai-nos, ó Deus misericordioso, se, nesses momentos, não contivemos as nossas queixas e, elevando o nosso pensamento ao Alto, perguntamos algumas vezes: Por que, ó Deu nosso, castigaste-nos tão rudemente? Perdoai-nos, por isso, ó Pai Nosso, que estais no Céu, e que guardais agora, junto de Vós, o nosso querido filho José Carlos, e vos pedimos dizer-lhe que mantemos a sacrossanta esperança  de também, um dia, quando formos convocados por Vós, podermos estar novamente ao seu lado e assim ir tributa-lhe tantos beijos quantos, dia a dia, momento a momento, lhes estamos enviando daqui de baixo, daqui deste “vale de lágrimas”, onde, aqueles outros entes queridos que ele tanto amou e ama ainda, continuam precisando de nós. Perdoai-nos, Senhor, e não permitais que se afastem dele e dos demais ente queridos as Vossas e as nossas eternas bênçãos. Augusto e Mile, 11-2-73

 

De repente, observamos que uma criatura humana mudou de hábito, especialmente em público: já não anda tão depressa, com a cabeça erguida, não mais saúda os seus amigos à distância, evita encarar as pessoas... É que algum grande sofrimento passou a torturar-lhe a pobre alma. Só o tempo, grande médico, grande arquiteto, grande professor, poderá, com a ajuda de Deus, colaborar para restabelecer, no que for possível, a situação anterior. ( 11-3-73)

 

A grande dor, a dor que atinge a alma é muda! Portanto, deveria provocar, apenas, soluços sufocados e lágrimas disfarçadas... Nada de nossos ferimentos com lamúrias e choradeiras que, inclusive podem perturbar as pessoas que, embora muitas vezes mais afastadas do nosso grande sofrimento, circulam ao nosso derredor... ( 23-8-73)

 

Se os homens infelizes que, em vida, realizaram grandes obras, sejam na filosofia, literatura, escultura, pintura, música, filantropia, humanismo, etc., e que, muitos morreram no anonimato, ostracismo, penúria, martírio, pudessem reviver no mundo de hoje e avaliar os benefícios que, imorredouramente, o seu estado de sofrimento produziu, de certo, se sentiriam compensados, em incontáveis vezes, agradecendo até ao Bom Deus por ter-lhes concedido, naqueles amargos e saudosos tempos, tanta sabedoria e acerto... ( 14-2-82)

 

“Se queres a paz, prepara-te para a guerra”  ( “Si vis pacem, parabellum”) ─ Existem dois tipos essenciais de paz: a paz interior, a paz de espírito e a paz social, a paz externa, da qual somos parte também, permanentemente. A paz de espírito, interior, podemos controlar, gozá-la em muitos momentos, alguns até dos mais difíceis. Mas, se não houver paz externa, social, em que nós próprios, nossos familiares, nossos amigos e outras inocentes criaturas são prejudicadas, ofendidas, agredidas, martirizadas, desaparece paulatina ou instantaneamente a nossa paz interior... Por isso que somente poderá existir maior percentagem da paz sobre a face da terra, e isto repetimos sempre: apenas quando os governos, suas forças armadas, quando os homens de todas as raças, das mais diversas condições sociais, quando todos forem justos, honestos, trabalhadores, generosos e usando a inteligência que Deus concedeu a cada um, seguirem os ensinamentos de Cristo Jesus. Paz absoluta, perfeita, integral, nunca existirá entre os homens, porque estes, pela lei da própria natureza, devem desenvolver seus ciclos de vida, entre sofrimentos e alegrias, acertos e fracassos, para um dia deixarem o convívio de seus entes queridos e aí sempre haverá inevitável tristeza nos corações... ( 20-2-83)

 

Não! Jamais entenderemos ou justificaremos a auto-destruição ─ o suicídio... Ainda que a infeliz criatura não tivesse um só parente, um simples amigo, a quem causasse sofrimento em face de seu tresloucado gesto, quem dele depois ─ por força da apuração e da divulgação dos fatos ─ tomasse conhecimento e perguntaria: “Porque, porque?”. O suicídio é uma questão de consciência mais para o que se vai do que para os que ficam... É uma falta de caridade para os que sobrevivem e sofrem diante de sua atitude de desespero e covardia. Todos os males terrenos tem remédio, paliativo, consolação... No momento extremo, de desespero, se alguém pudesse deter a consumação do desvairado ato, certamente que ambos, seriam aplaudidos pela justiça dos homens e pela clemência de Deus. ( 4-11-83)