“ Ora bolas !”
                                                                                                           
     Como todas as crianças, Zé Pedro sempre estava disposto a tirar proveito do tempo para algum tipo de lazer. Sua preferência era pelo joguinho de bola num terreno baldio, no calçadão ao lado da igreja, numa rua sem trânsito ou até mesmo na graminha do jardim público. Sua mãe, sempre que conversava com alguém sobre seu filho, dizia : “ o negócio dele é bola”.
     De tanto ouvir a mãe Zé Pedro também passou a achar que o seu negócio era a bola mesmo. Sonhava com jogos, com uniformes de times de futebol, com grandes salários, com a fama e com o sucesso.
     Nas primeiras séries do grupo escolar suas notas não acompanhavam o mesmo índice de aproveitamento de seus chutes a gol. Suas notas eram baixas e as reprovações  constantes. A mãe e os vizinhos diziam que sem estudo tudo seria difícil mais tarde, só o jogo de futebol não lhe daria a estrutura necessária para garantir um futuro pelo menos razoável.
     Algumas unhas rachadas, canelas sempre roxas, o Zé Pedro, que jogava bola em qualquer lugar onde fosse possível, pela cidade toda, era muito conhecido e todos realmente confirmavam que  “ o seu negócio era a bola “. Não se formava um time sem sua presença. Era requisitado por todos os colegas.
     O curso primário não conseguiu lhe fornecer um diploma por mais que a mãe e as professoras insistissem. Desistiu na terceira série. Foi fazer serviços esporádicos pela cidade: procurar ferro velho, limpar quintais, carregar algumas compras nas feiras.
     Ele cresceu mas o dinheiro era sempre curto. Seus empregos eram raros. Suas chuteiras eram sempre fornecidas por elementos da cidade que achavam que “ o seu negócio era a bola”. Davam-lhe também algum dinheiro, pouco, alguma roupa e algum trabalho, que já sabemos qual era.
     Os colegas de infância foram se colocando, “subindo” na vida, vestiam-se bem, tinham bons sapatos, namoradas, passeios, festas, etc. Zé Pedro percebeu que andava era pra trás, sem essas vantagens todas. Pensou e pensou; para conseguir dinheiro e se equiparar aos antigos colegas optou pela marginalidade, começando com pequenos roubos em casas de seus próprios amigos e conhecidos.
     Continuava jogando futebol, e bastante, mas nas suas andanças pelo mundo do crime conheceu assaltantes e marginais mais perigosos e com ideias mais “avançadas”. O pior aconteceu. Convidado para um assalto a um grande banco Zé Pedro aceitou. Participou, matou e foi preso.
     Após o julgamento, quase um ano depois, acompanhado com sofrimento pela mãe e por alguns “craques” dos velhos tempos das peladas nas ruas, Zé Pedro foi condenado a dezesseis anos de reclusão. Como não tinha passagens anteriores pela polícia foi logo enviado para uma prisão de uma cidade maior onde pudesse executar algum trabalho.
     Zé Pedro passou a costurar bolas de futebol para uma empresa que mandava serviços para a prisão.
     Ainda hoje,  quando alguém pergunta por ele a sua mãe, ela tristemente responde: “o negócio dele era mesmo a bola...”. 

N. A . : conto de pura ficção.           
 

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