Semelhança
Havia na cidade um
indivíduo que era único, pelas suas características
e por seu comportamento. Bebia muito e trabalhava bastante. Andava descalço,
sempre de camisa aberta e com um chapéu que já devia ter
feito um número de aniversários que se iniciava na era pré-colombiana.
Era pau pra qualquer
obra, mesmo bêbado. Era também conhecido pela alcunha de “Botão”.
Seu apelido surgira
há muitos anos, logo que chegou à cidade, devido à
quase inexistência do famoso objeto em suas camisas. Todas elas ficavam
à mercê do vento, verdadeiras bandeiras desfraldadas.
Vários caminhoneiros
da cidade usavam seus serviços para carregar ou descarregar seus
caminhões. Por esse motivo Botão era conhecido e também
amigo de todos eles.
Ninguém sabia
nada sobre sua família, onde nasceu, quantos anos tinha, seu nome,
seu sobrenome; não trazia consigo sequer uma certidão de
nascimento. Para as leis ele inexistia. Não possuía nada
de seu, ganhava roupas e sapatos velhos. Dormia num barracão da
prefeitura. Todos os domingos almoçava com o padre.
Um dos caminhoneiros,
amigo de Botão, viajando por lugares distantes, viu pelas ruas de
uma certa cidade o Botão bem vestido, calçado, penteado,
elegante até. Chamou-o pelo apelido famoso várias vezes mas
não obteve resposta.
Parou o caminhão
e, como fazia sempre, deu um tapa em suas costas e falou um palavrão.
A reação foi imediata e armou-se uma confusão danada.
O motorista olhava para o “Botão” e não entendia nada,
jurando que o safado tinha duas caras e se comportava de formas diferentes
nas duas cidades.
Na delegacia, o motorista
jurava de pés juntos que o Botão estava brincando e que deveria
fazer até pouco caso do pessoal da sua cidade, tamanha era a diferença
de comportamento nas maneiras, no modo de se vestir e, mais estranho ainda,
este não bebia. Além de tudo era velho amigo do delegado
!
Acreditando no motorista,
as autoridades propuseram-lhe que trouxesse até ali o tal Botão
para que se fizesse um julgamento melhor da situação.
Chegando de volta
à sua cidade, o motorista relatou o acontecido e, em sua primeira
viagem para aquela localidade, depois de muito custo, colocou Botão
na boleia e partiu. Botão viajou conforme sua maneira de viver,
com suas características.
O delegado ficou
pasmo diante daquela figura. Olhou para o caminhoneiro sem entender nada.
A semelhança era total e qualquer um poderia se enganar. Diante
dos dois “Botões”, todos os funcionários da delegacia e curiosos
riam às gargalhadas.
- São gêmeos ! – não havia
quem o negasse.
Sobre o indivíduo
daquela localidade havia informações até sobrando.
Era fácil saber tudo sobre sua pessoa com certeza, com firmeza.
Ele era ele mesmo ! Mas sobre o Botão... as únicas certezas
eram de que além de ele possuir braços e pernas, também
falava.
Foi relaxada a queixa,
esquecida a ocorrência e tudo foi creditado à grande semelhança
entre Botão e seu sósia.
Botão, em
sua ignorância, distante de tudo e doido por um gole da “marvada”,
disse:
- Essa viagem valeu pra alguma coisa, eu que
não tinha nada até hoje, agora possuo semelhança !
N. A. : Conto de pura ficção.
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