"Telhado de Vidro"
Namoraram por mais de quatro anos; o noivado durou seis meses. O casamento foi muito festejado: fartura e muitos convidados. Eles formavam o que se pode chamar de par ideal. Possuíam uma boa casa, um carro em boas condições, além de bons salários. Ele era chefe de contabilidade de uma firma e ela com muitos anos de serviço no departamento pessoal de outra empresa. Íam para os serviços juntos e voltavam para casa em horários diferentes. Passeavam de vez em quando.
Depois de alguns anos ele já não era o mesmo marido carinhoso e gentil, nem ela a mesma namoradinha de sempre, mas a vida continuava serena e normal. Tudo normal até que uma carta anônima, colocada sobre sua cadeira, no escritório, tirou o sossego daquele marido: algo estava errado e ele deveria investigar.
Em casa comportava-se da melhor maneira possível, tentando passar uma calma que já não possuía. Não percebia nada mas sentia muito. A esposa não demonstrava nada que pudesse condená-la. Por mais que procurasse não conseguia nada, nenhum gesto, um olhar, nada que a incriminasse. Procurava nos casacos, nas bolsas, nas gavetas, qualquer prova que servisse para justificar suas preocupações, mas nada, nada mesmo.
Nova carta foi colocada sobre sua cadeira e sua preocupações tornaram-se terríveis; como acreditar em cartas anônimas se não havia nada de prático que comprovasse essas cartas? Flava pouco, não comia quase nada; no serviço, o seu jeito alegre e conversador já não era o mesmo. Muitas vezes era visto em sua sala cabisbaixo e caladão, mão no queixo e olhar distante, procurando um meio de esclarecer aquelas cartas de uma forma definitiva. A ideia veio, ficou e cresceu: procuraria um investigador.
Deu as ordens todas ao homem, pedindo sempre muito sigilo. A esposa passou a ser o alvo exclusivo daquele profissional, que não a perdia de vista nunca. Chamado ao escritório do marido, após algumas semanas, o investigador disse que havia trabalhado bastante, mas que somente mais tarde poderia dar o resultado de tudo. Havia ainda muitas dúvidas.
Com uma pasta na mão o investigador voltou ao escritório, sempre como alguém que procura informações ou que faz algum trabalho ali por perto. Muito discreto, sem se fazer notar. Disse: "Ela tem alguém! Há encontros constantes!"
Pedindo mais uma vez sigilo, o marido deu ordens para que fosse investigada toda a vida daquele canalha que tomava o seu lugar e era motivo das cartas anônimas que tiravam sua calma e bom humor. Nunca poderia esperar isso de uma pessoa tão dócil, submissa, "ingênua" mesmo, como sua esposa.
O resultado das investigações veio mais rápido do que ele esperava: o canalha do amante de sua mulher era o marido de sua amante.
Maio - 2015
N.A. : conto da mais pura ficção. |