Parte inicial de uma longa memória...
O
Jornal de Piracicaba de 10 de março de 1962 publicou o fato com
destaque:
O Governador Carvalho Pinto acaba de assinar decreto desdobrando a 12ª. Cadeira (Horticultura, Fruticultura, Silvicultura, Olericultura e Floricultura) nas cadeiras de Horticultura e Silvicultura. A Cadeira de Horticultura compreenderá as seguintes disciplinas: Fruticultura, Olericultura, Floricultura e Arquitetura Paisagística.A Cadeira de Silvicultura compreenderá: Dendrologia e Dendrometria, Inventários Florestais, Ecologia e Fitogeografia, Silvicultura Aplicada, Proteção e Administração das Bacias de Captação e Proteção de Mananciais e Tecnologia de Produtos Florestais. As disciplinas da Cadeira de Horticultura serão ministradas nos semestres do 3o. ano e as da Silvicultura nos semestres do 2o. ano do Curso de Agronomia da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”. Fica facultado ao atual titular da Cadeira desdobrada por este decreto optar por uma das Cadeiras resultantes deste desdobramento.”
Voltando ao início...Após
meu ingresso na ESALQ, comecei, ainda “bicho” a estagiar na Cadeira
de Química Analítica onde permaneci até início
de 1964 quando migrei para Cadeira de Silvicultura a convite do Prof. Ronaldo
Algodoal Guedes Pereira do qual guardo excelentes lembranças e muito
aprendi com seus exemplos de dedicação, determinação,
entusiasmo e, sobretudo, visão de longo alcance. Com ele aprendi
”que teríamos que batalhar para sermos os melhores da América
do Mundo”. Grande Mestre Ronaldo... minhas
reverências!!!! Quando cheguei ao “laboratório de química”
dispúnhamos de duas bancadas, duas pias, uma pipeta, uma bureta,
um copo becker,
uma espátula, uma pinça e um bico de búnsen
( estes três últimos guardo, até hoje, como lembranças).
Mas havia uma novidade estrondosa: a FAPESP acabara de doar um laboratório
completo para produção, processamento e testes de celulose.
Fato inédito numa Escola de Agronomia. Começava a nascer a
liderança das pesquisas de celulose no Brasil, a despeito das escolas
de química, engenharia química e aparentados. O agrônomo ( e
o futuro engenheiro florestal) começava a mostrar competência
numa área da qual “até Deus duvidava” naquela hora. Bem... deu
no que deu!!!
No meio do quinto
ano fui convidado ( junto com Walter Suiter
Filho, excelente colega de turma, “meu irmão” à época!)
para permanecer como professor junto à Cadeira de Silvicultura.
Para meus pais foi a glória dado o
prestígio que o docente da ESALQ gozava naqueles dias. Para mim,
uma angústia tremenda pois era professor
do Curso Luiz de Queiroz e o salário de professor na USP seria 1/3
( sim, um terço) do cursinho. Optei pela carreira universitária
e não me arrependo até hoje.
Assumindo meu posto
de “assistente” do mestre Ronaldo, uma das primeiras missões foi
ajudá-lo na tese que vinha preparando e que defendeu em 1969 (Estudo
comparativo das propriedades físico-mecânicas da celulose
sulfato de madeira e E. saligna,
E. alba e E. grandis).
No ano anterior, o Prof. Helládio
já tinha “inaugurado” a sequência de teses com a sua
de Professor Catedrático (Aspectos do emprego de fertilizantes
minerais no reflorestamento de solos de cerrado do estado de São
Paulo com Eucalyptus saligna). Em
paralelo, o Prof. Mário Ferreira, em 1968 defendia sua tese de doutorado ( Estudo
da variação da densidade básica da madeira de Eucalyptus alba
e E. saligna) e, aproveitando o embalo, em 1970, atacou com uma continuação
para livre-docência (Estudo da variação da densidade
básica da madeira de povoamentos de Eucalyptus grandis).Como
se não bastasse, oProf. João Walter Simões contra-atacava,
em 1968, com sua de doutorado (Métodos de produção
de mudas de Eucalipto) e Prof. Antonio Paulo Mendes Galvão,
no mesmo ano de 1968, com sua de mestrado (Características da
distribuição de alguns preservativos hidrossolúveis
em moirões de E. alba tratado pelo
processo de absorção por transpiração radial).
Para não ficar
muito atrás, aventurei-me na minha de doutorado em 1971 (O uso
da madeira
de Eucalyptus saligna
na obtenção
de celulose pelo processo bissulfito-base
magnésio).
Foi uma forma de me livrar das “cobranças” do “capo” Helládio.
A isso, some-se ainda outras não relacionadas à “GRANDE FAMIGLIA
MIRTACEA” a saber: doutorado do Prof. Walter Suiter
Filho em 1971 (Propagação vegetativa
de coníferas do gênero Pinus por enxertia),
livre-docência do Prof. João Walter Simões em 1972
( Efeitos da omissão de nutrientes na alimentação
mineral do Pinheiro do Paraná cultivado em vaso) e M.S. do Prof. Celso Edmundo Bochetti Foelkel em
1973 (Unbleached kraft pulp properties of some of the brazilian and us Pines). Com isso, registre-se que
o período 1968-1973 foi o mais profícuo ( com
relação à geração de teses) da Cadeira
de Silvicultura, depois Departamento de Silvicultura e hoje Departamento
de Ciências Florestais. Parafraseando um energúmeno de plantão
em Brasília: “Nunca antes nesta ESALQ...”.
Voltando ao eucalipto,
devo um agradecimento especial a
esse mal-falado gênero que, inclusive me propiciou algo nunca antes
sonhado: o Prêmio Moinho Santista ( hoje Prêmio Bunge) recebido
em 1994, às vésperas da aposentadoria. Na síntese
sobre a concessão é destacado: “Há mais de trinta
anos, o eucalipto - árvore australiana integrada à paisagem
brasileira desde o início do século - é um dos principais
objetos de estudo do engenheiro agrônomo Luiz Ernesto George Barrichelo
(1941). Graças às pesquisas pioneiras desenvolvidas por ele
e outros estudiosos, a indústria brasileira de papel passou a utilizar
amplamente a madeira de eucalipto em substituição à
da araucária, evitando grandes prejuízos ecológicos
e tornando o país
um dos principais exportadores mundiais da celulose extraída
dessa árvore.
Além de apresentar trabalhos de relevante importância
em encontros científicos, Barrichelo produziu mais de noventa artigos
sobre recursos florestais e produção de celulose de eucalipto”.
(http://www.fundacaobunge.org.br/projetos/premio-fundacao-bunge/premiado.php?id=107&name=luiz_ernesto_george_barrichelo)
Uma pergunta recorrente
é porque ter estudado o processo sulfito para a produção
de celulose se o mesmo era de restrito interesse no Brasil. Pelo fato de
ter colaborado na parte braçal da tese do Prof. Ronaldo com o processo
sulfato, julguei-me( como era presunçoso,
oh céus!) “diplomado” no dito-cujo. Daí para decidir trocar
o “ato” pelo “ito”
foi um pulinho! Conversei com Prof. Helládio
e Prof. Ronaldo e consegui convencê-los de que seria interessante
diversificar nossas “tecnologias”. A meu favor começavam pipocar
manifestações contra o processo kraft
com relação aos problemas de poluição. A Melhoramentos,
Cambará e outras menores ainda produziam celulose sulfito
o que serviu de reforço à idéia. E assim foi... depois
de alguns meses já estava arrependido pois a produção
e análise do licor eram extremamente complicadas, para não
falar no cozimento. Porém fui em frente, mas sempre quando me distraia,
era pego de surpresa com o “sonho” de destrocar o “ito”
pelo “ato”. Sobrevivi! Deo gratias!
Mas, nem só
de eucalipto “vivíamos” naqueles saudosos dias.
Corria o ano de 1976
e o Prof. Helládio sentiu que, com
o crescimento do Departamento, estava ocorrendo uma dispersão de
horizontes dos professores. Aí tevea
brilhante idéia de identificar um projeto que agregasse todos os dito-cujos
( mais ou menos desgarrados). Nascia o projeto USP/ESALQ/BNDE/FUNTEC nº
305/76, também conhecido como PROJETO PESQUISA
TECNOLÓGICA PARA MELHORIA DOS PINHEIROS TROPICAIS, vulgo
PPT.
Registro
com satisfação que o relatório “ Celulose kraft de
madeiras de pinheiros tropicais” faz parte do primeiro Boletim Informativo
editado e foi, a partir dele, gestada
e parida minha tese de livre-docência ( Estudo das características
físicas, anatômicas e químicas da madeira de Pinus
caribaea var. hondurensis Barr. E Golf. para a produção de
celulose kraft)
Mas,
recordemo-nos, um pouco do IPEF.
A
história do IPEF --- Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais ---
constituído em 1968 como sociedade civil sem fins lucrativos, hoje
associação sem finalidades econômicas, está
intrinsecamente ligada à historia
do Departamento de Ciências Florestais da ESALQ / USP.
Conforme
o início destas reminiscências, em
O
apoio para a implementação de um novo sistema cooperativo
no Brasil veio da Champion Celulose Ltda.( hoje,
International Paper do Brasil) , com a
qual, desde o início da década de 1960, o Professor Helládio
realizava trabalhos conjuntos para melhorar a qualidade das plantações
florestais ainda incipientes à época. A Duratex S.A., logo
a seguir, se engajou no novo projeto e depois outras três
empresas que se constituíram nas fundadoras do Instituto, em abril
de
A
missão do Instituto, desde sua fundação,consiste
no planejamento, na implementação e na coordenação
de ações e gerenciamento de recursos, destinados a estudos,
análises e pesquisas na área de recursos naturais, com ênfase
na ciência florestal.
Outra
pergunta recorrente: e o IPEF e eu?
Como
fui admitido como professor junto a então
Cadeira de Silvicultura em junho de 1967, recém-chegado acompanhei
o burburinho acerca da institucionalização do relacionamento
entre algumas empresas florestais com a Universidade. Em outras palavras ( e
para encurtar) sou um dos poucos “sobreviventes” que acompanharam a gestação,
parto, batizado, crisma, primeira comunhão, etc., etc., do menino
que completou 40 anos no no ano de 2008.
Como minha memória não é tão privilegiada,
só consigo me lembrar de dois professores que se destacaram para
o sucesso inicial do IPEF ( com todo
respeito aos outros que já compunham o time de pioneiros): Prof. Helládio
( tido como o “pai”) e Prof. Ronaldo, que já chamei anteriormente
de “a mãe” em depoimento no
livro “A Floresta e o Homem”, publicado nas comemorações
dos 30 anos do “garotão”). Outra fonte importante para a história
do IPEF pode ser encontrada no livro publicado 10 anos depois, quando da
comemoração dos 40: “A História do IPEF na Silvicultura
Brasileira”.
Sempre
procurei participar e colaborar nas lides ipefeanas
e devo ao mesmo ( IPEF/PIRACICABA e IPEF/ASSOCIADAS) as facilidades concedidas,
oportunidades abertas, inspirações e desafios para evoluir
na carreira docente e de pesquisador. Inclusive, o respeito e admiração
eram mútuos que dois fatos foram de destaque no início da
década de 70: doação de um digestor REGMED para a
SQCP ( Seção de Química,
Celulose e Papel--- bons tempos, não?) e a primeira “continha” para
administrar os parcos recursos da Seção. Essa benesse depois
foi estendida a outras seções/ setores ( hoje
laboratórios) da Cadeira/Departamento e hoje, a Diretoria Executivatem
que “conviver” ( “sobreviver” e “rebolar”) com a administração
de cerca de 100 contas que movimentam de
Em
1980 o IPEF entrou em “rota de colisão” com o Departamento ( briguinhas
padrões de irmãos adolescentes ou aborrescentes).
O LCF com 18 anos e o IPEF com 12. Na realidade... o
que aconteceu foi que o “pai de todos” se aposentou e a filharada perdeu
o rumo, o prumo, o azimute, o escambau!!!
Nestas
alturas, a gestão administrativa já tinha mudado umas três
vezes e o modelo da época previa a existência de três
diretores: administrativo, técnico e científico. Como uma
possibilidade de gerenciar o pandemônio reinante ( inclusive
as empresas cogitavam de “fechar as portas”) fui lembrado como “a salvação
da lavoura” e convidado para assumir o cargo (honroso) de Diretor Administrativo.
Como todo idiota que se preza, aceitei ( não
sei porque até hoje). Depois de um mês já concluía
que “tinha entrado numa fria”. Resumo da ópera: após 6
meses de tentativas, finalmente consegui me demitir. Permaneço na
dúvida sobre quanto foi incompetência, quanto foi inabilidade,
quanto foi imperícia... enfim... um
montes de “is”. Hoje aposentado, posso ver à distância que
realmente administrar conflitos não é brincadeira...e se
o conflito for com professores, então... não
há possibilidade de avaliar ou medir as dificuldades. Minha conclusão
é por causa de mais dois dos malditos “is” :
imortalidade e indestrutibilidade que caracterizam grande parte dos docentes
da USP, como de todo o funcionalismo público a nível municipal,
estadual, federal e mundial ( e “intergalatical”,
se houver no futuro)
Mas... sempre
tem um mas.
Entrei
em hibernação até junho de 1986 quando voltei, com
toda pompa e circunstância, como Diretor Científico onde bati
o recorde de “durabilidade” até 1992 ( excluindo Mestre Helládio
que agüentou o rojão por 11 anos-1968/79),
quando entrei em outra esparrela assumindo,
no início de
Até
o calvário da “municipalidade esalqueana”,
acumulei entre 1988 e
Após
a aposentadoria permaneci como professor permissionário ( termo hororroso)
até 2001 e em seguida, mandei-me para outras plagas, prados e campinas,
retornando à casa em maio de 2004 como Diretor Executivo do IPEF
onde permaneci até abril de 2016, porque Deus e os “is”
permitiram.